Você está no banco e, enquanto espera a sua vez na fila de atendimento, ouve a conversa: uma moça tenta convencer um idoso a sacar uma grande quantidade de dinheiro. Pelo tom do diálogo, você conclui que eles são próximos e que ela está forçando o idoso a fazer aquela transação. Nessa situação, você pode estar presenciando um ato de violência patrimonial.
Esse é o nome dado à violação de direitos relacionada ao dinheiro, que atinge principalmente idosos e mulheres. Dados da Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos do Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania revelam que, somente nos três primeiros meses de 2024, foram registradas mais de 40 mil denúncias de violações contra pessoas de 60 anos de idade ou mais. Dessas, 5,72% são de violência patrimonial.
As denúncias vêm, em sua maioria, pelo Disque 100, o principal canal para comunicar às autoridades casos de abusos aos direitos humanos no Brasil.
O que fazer ao presenciar situações desse tipo, principalmente quando as vítimas não têm condições psicológicas, físicas ou materiais para sair do ciclo de violência? É o que discutimos nesta matéria.
Como identificar situações de abuso financeiro contra o idoso
As práticas mais comuns de violência financeira são esconder cartões de crédito e débito, furto de senhas, sumir com objetos de valor ou dinheiro. Ou ainda, a exploração financeira, ao forçar a realização de saques, a assinatura de contratos ou a contratação de empréstimos - especialmente o crédito consignado, muitas vezes feitos em nome de outras pessoas. Outro tipo comum são os golpes e fraudes virtuais ou aplicados por telefone.
Nem sempre essas violações são feitas por desconhecidos. Muitas vezes, isso acontece dentro de casa, em atos praticados por cônjuges, filhos, netos e outros parentes próximos, e nem sempre é fácil de ser notado.
Mas algumas pistas de que algo não está indo bem podem surgir em conversas informais, até quando a pessoa está distraída e faz comentários do tipo “precisei fechar minha conta”, “fiz um empréstimo e diminuiu minha aposentadoria” ou “não estou conseguindo pagar as contas.”
Em idosos, outro sinal comum de abuso é a mudança de comportamento, como irritabilidade, piora na saúde, agitação ou preocupação excessiva. Dependendo do seu grau de proximidade com a pessoa, com muita delicadeza, você pode iniciar uma conversa para tentar entender o que está acontecendo.
Golpes e fraudes financeiros contra idosos
Por sua vulnerabilidade, idosos estão entre as principais vítimas de golpes e fraudes financeiras. Segundo o Radar Febraban 2024, 40% das pessoas acima de 60 anos já foram vítimas ou sofreram tentativas de algum tipo de golpe envolvendo sua conta bancária.
A informação é a melhor forma de prevenção, mas se conhecer alguém que foi vítima de golpe, reúna evidências, notifique o banco para que ele tome as medidas cabíveis e faça um boletim de ocorrência, online ou na delegacia mais próxima.
Dentre os golpes mais comuns, estão a clonagem do cartão, pedidos de dinheiro via WhatsApp, golpe do empréstimo consignado ou do FGTS. Conheça outros golpes financeiros contra idosos e saiba como se proteger.
A quem recorrer no caso de violência patrimonial contra idosos
Os direitos dos idosos estão definidos no Estatuto do Idoso, uma lei que determina que a família, a comunidade, a sociedade e o poder público têm a obrigação de “assegurar ao idoso, com absoluta prioridade, a efetivação do direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária.”
Como denunciar exploração do idoso: disque 100 (Delegacia do idoso)
O Estatuto estabelece uma rede de proteção formada pelos Conselhos do Idoso existentes nos municípios, estados e no âmbito federal. Além dos Conselhos, as queixas de maus tratos a idosos podem ser feitas às autoridades policiais e ao Ministério Público. Podem ser feitas também pelo Disque 100:
- Pelo telefone 100 (ligação gratuita).
- Pelo WhatsApp (61) 99611-0100.
- Pelo site do Disque 100, que conta com atendimento 24 horas, sete dias, inclusive em libras.
As denúncias são apuradas e os agressores são obrigados a fazer o ressarcimento, além de responderem judicialmente, com pena de multa e detenção. Ficam impedidos, também, de fazer a gestão financeira do idoso.
Muitas vezes, a violência financeira acontece a partir de telefonemas de estranhos, e-mails ou mensagens por WhatsApp que levam à contratação de produtos com prestações atreladas à aposentadoria, sem que a pessoa idosa tenha consciência do que está contratando. Nessas situações, se você for um familiar ou conhecido, entre em contato com a empresa que fez a oferta, denuncie e peça o imediato cancelamento.
Se não for atendido, você poderá recorrer à área de Ouvidoria que, nas companhias, ajuda a resolver questões não solucionadas no primeiro atendimento. Poderá, também, registrar a sua queixa no portal www.consumidor.gov.br, um serviço público online que apoia a solução de conflitos relacionados ao consumo de produtos e serviços.
Conheça a autorregulação dos bancos para o crédito consignado e o público vulnerável
Para combater o assédio comercial na oferta de crédito consignado, que acontece quando vendedores usam táticas agressivas ou coercitivas para pressionar o idoso a realizar compras, adquirir produtos ou serviços ou até mesmo contratar empréstimos, a Febraban (Federação Brasileira de Bancos) criou, em parceria com as instituições financeiras, a Autorregulação Bancária do Crédito Consignado.
A autorregulação conta com um sistema de bloqueio de ligações para quem não deseja receber ofertas de crédito consignado, um banco de dados para monitoramento das reclamações recebidas em razão de ofertas inadequadas e, ainda, a implementação de medidas de transparência e combate ao assédio comercial.
A FEBRABAN conta, também, com uma cartilha orientativa sobre como as instituições financeiras podem manter um bom relacionamento com o público vulnerável, assim chamadas as pessoas que precisam de cuidado especial em razão de deficiências, idade, escolaridade, conhecimento digital e superendividamento.
Para saber mais, assista à entrevista de Mona Dorf, diretora adjunta de Mídias Sociais da Febraban, com o diretor de Sustentabilidade, Cidadania Financeira, Relações com o Consumidor e Autorregulação da entidade, Juliana Grecco, presidente do Conselho da Autorregulação da Febraban, e Juliana Sandri, chefe do Departamento de Supervisão de Conduta do Banco Central:
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Matéria publicada em 13/11/2018 e atualizada em 29/08/2024